Ego-as-a-Service: O negócio da auto-adoração nas redes sociais
Nos últimos anos, presenciamos o nascimento de uma nova economia digital: o Ego-as-a-Service. Você já deve ter percebido esse fenômeno. A cada dia, mais empresários, executivos e influenciadores corporativos tomam as redes sociais como palanque pessoal para opinar sobre tudo – mercado, sociedade, produtividade, filosofia, comportamento humano. É como se todos tivessem sido subitamente promovidos a pensadores contemporâneos, guardiões da verdade e arautos da inovação.
E o mais curioso? A audiência aplaude. O algoritmo recompensa. Cada post recebe curtidas, comentários de "grande reflexão, mestre" e compartilhamentos fervorosos. Mas, pare e pense: isso tudo é mesmo genuíno? As pessoas realmente se importam com a opinião desse CEO sobre ética, futuro do trabalho ou propósito, ou estão apenas curtindo por inércia? O que estamos assistindo aqui é sabedoria aplicada ou um espetáculo de autopromoção? Será que, no fundo, ninguém está interessado nisso, mas o jogo da vaidade digital se tornou tão forte que ninguém mais consegue parar?
Não esquecer das apresentações. Sempre tem um slide com o palestrante descrevendo como a sua formação de Stanford, Harvard, suas certificações e suas experiências profissionais são importantes e geram autoridade para ele falar o que ele vai falar. Mas também dão espaço para o brilho da sua egotrip florescer, ou por cortes de podcast que começam com “o pessoal sempre me pergunta…”. Quem? Quantos perguntam? Provavelmente é só você querendo falar sobre o assunto.
A imagem "The Maturity Climb" ilustra bem esse teatro do ego (imagem que inspirou escrever e refletir sobre o tema). No nível mais baixo da montanha, vemos personagens gritando "Olhem para mim!", inflando suas certezas, buscando status e reclamando do mundo. Conforme a escalada avança, o barulho diminui, o olhar se expande, e no topo estão aqueles que entenderam que maturidade é menos falar, mais ouvir; menos provar, mais fazer; menos ego, mais entrega real. Mas a lógica das redes sociais inverte esse processo: premiando não a sabedoria silenciosa, mas a verborragia constante. Quanto maior o ego, maior o engajamento. E assim o Ego-as-a-Service virou um modelo de negócios.
Por que seguimos essas pessoas? Estamos admirando ou terceirizando nosso pensamento?
Existe uma diferença entre seguir alguém para aprender algo e seguir porque é mais fácil deixar alguém pensar por você. Essa é a grande armadilha do consumo de conteúdo hoje: em vez de gastar tempo refletindo e formando opinião própria, terceirizamos esse trabalho para figuras públicas.
Seguimos o empreendedor visionário, o CEO que posta "frases impactantes", o especialista em inovação que ensina como "pensar fora da caixa". Mas, sejamos honestos: o que realmente aprendemos? Será que estamos ali porque essas pessoas dizem algo que vale a pena ou porque o simples fato de segui-las nos dá uma sensação ilusória de pertencimento?
A verdade é que pensar dá trabalho. Exige analisar informações, confrontar ideias, sair da zona de conforto. Mas apertar um botão de "seguir" e replicar frases motivacionais é muito mais fácil. E o efeito manada faz o resto: alguém começa a ganhar relevância, o algoritmo favorece, e de repente temos um novo guru corporativo. E lá vamos nós, consumindo mais um post sobre "liderança inspiradora", "mindset de crescimento" e "disciplina como chave do sucesso". Ou, claro contratando consultoria ágil para ensinar a empresa a colar post-its mais alinhados possíveis na parede, ou gerenciá-los em ferramentas, menos fazer a liderança entender que problemas complexos não conversam com respostas óbvias, simplórias. E sim, melhores perguntas. Ah, também tem o clássico “vamos juntar todo mundo nesse projeto e chamar de squad”. Sem entender o conceito de squad, tudo que foi pensado e os valores (não financeiros) que o Spotify pensava para funcionários e times.
O problema não é o conteúdo em si. O problema é a falta de questionamento. Estamos consumindo esse conteúdo porque ele agrega valor ou somente porque ele está sendo repetido por todo mundo? E pior: será que os próprios influenciadores acreditam no que estão dizendo ou só estão alimentando o próprio ego para manter o jogo girando?
Será que alguém liga para a sua opinião sobre o mundo?
Sim. Isso deve doer para a maioria do pessoal. Afinal, independente dos milhões para lá ou para cá. O real impacto que você gera na sociedade é que tipo de cultura você aplica na realidade da sua empresa, nos funcionários, nas famílias desses funcionários, na comunidade, etc. Agora vamos inverter a perspectiva. Se você é um empresário, CEO ou figura pública no LinkedIn, pare e pense: você realmente acredita que sua opinião sobre política, sociedade, filosofia ou até sobre o próprio setor é relevante para além da sua bolha?
Sejamos diretos. O engajamento que esses posts recebem não significa que as pessoas realmente se importam com o que você pensa. Na maioria das vezes, elas interagem por interesse profissional, porque querem visibilidade dentro da sua rede ou porque o algoritmo condicionou esse comportamento. Muitos likes e comentários não validam uma ideia – muitas vezes, somente reforçam relações corporativas.
E aí entra a grande ilusão: o empresário, CEO ou guru motivacional começa a acreditar que tem algo a dizer sobre tudo. Começa a postar "grandes reflexões" sobre comportamento humano, sobre como "precisamos reavaliar nossos valores como sociedade" e sobre "o verdadeiro significado do sucesso". Quando, na verdade, fora dessa bolha, ninguém está prestando atenção. O ego engana. Dentro da bolha, você se sente relevante. Fora dela, você é só mais um.
Quando o ego vira um modelo de negócios
Se tem algo que a internet faz bem, é transformar qualquer coisa em produto. E foi assim que o ego se tornou monetizável.
Hoje, há um mercado inteiro baseado na venda de influência, cursos, palestras e livros girando em torno da figura do próprio influenciador. O que está sendo comercializado não é conhecimento, é a imagem de autoridade. Não basta ter uma empresa de sucesso, é preciso ser o produto. E assim vemos uma enxurrada de posts do tipo "os 5 segredos dos grandes líderes", "como escalar negócios sem perder a essência" e "a mentalidade que separa os bem-sucedidos do resto do mundo".
E sabe o pior? Funciona. O algoritmo das redes sociais recompensa autopromoção. Quanto mais exposição, mais alcance. Quanto mais frases de efeito vazias, mais compartilhamentos. O que importa não é a profundidade do que se diz, mas a capacidade de jogar para a torcida. O ego virou uma moeda digital.
O caminho para sair da bolha do ego
Diante desse cenário, vale a reflexão: por que consumimos esse tipo de conteúdo e o que isso diz sobre nós? Estamos realmente aprendendo algo ou apenas buscando reforçar nossas próprias crenças e fazer parte de um grupo?
Se quisermos escapar da lógica do Ego-as-a-Service, precisamos parar de consumir conteúdo no piloto automático. Questionar mais, desconfiar de fórmulas prontas, buscar o que realmente gera valor. Se um influenciador ou empresário só aparece para reforçar sua própria grandiosidade, talvez seja melhor investir nosso tempo em algo mais produtivo.
E se você é um empresário que acredita que sua opinião precisa ser compartilhada o tempo todo, aqui vai uma dica: talvez o silêncio comunique mais maturidade do que qualquer post no LinkedIn.
Conclusão: O que realmente importa?
A imagem "The Maturity Climb" nos ensina que a evolução acontece quando o ego deixa de ser o centro das atenções. No topo da montanha, não estão aqueles que gritam mais alto, mas os que aprenderam a observar, escutar e agir com propósito.
Se o mundo corporativo quiser realmente evoluir, talvez seja hora de substituir o Ego-as-a-Service por algo mais útil. Porque, no final, ninguém sobe a montanha carregando um megafone – só sobe quem aprendeu a caminhar sem precisar que o mundo todo olhe para ele.
Mas outra questão é importante: Tá bom, se aparecer nas egotrips não funciona, o que funciona? Pois a concorrência fará essa tática para marcar presença e reafirmar autoridade. Seria muito óbvio eu vender um problema e dar a solução, não é mesmo? É o básico do Marketing. Na verdade, da minha experiência, acredito que o que mais gera conteúdo relevante são cases onde você conta como resolver um problema, mas também fala das variáveis, premissas e restrições que tinha quando resolveu o problema. E com isso aponta UM caminho. Não O caminho. Mas assim como em política, e talvez isso seja uma das grandes causas da polarização hoje em dia, não tem resposta pronta. Não é só ouvir A ou B. Sim, pensar por si. Avaliar o problema, sua realidade e entender se o que você está gerando é só uma egogtrip gostosa com curtidas, ou se realmente você agrega algo no assunto. Não se contentar com respostas simplórias para problemas complexos. Melhorar as perguntas e continuar perguntando e se questionando. Quais são os interesses envolvidos com a geração daquele conteúdo? Egotrip ou geração de conteúdo real?