Nos últimos anos, com o acelerado avanço tecnológico e a criação diária de startups, vemos surgir novos conceitos de gestão empresarial a cada dia e estes sempre buscam se cacifar e impor como o novo paradigma organizacional a ser seguido pelo mercado. Inovação na área de gestão, como em todas as outras áreas, é extremamente válida e deve ser incentivada. No entanto, não podemos descuidar de alguns conceitos formulados há mais tempo e que permanecem aptos a impactar positivamente nos processos de companhias nos dias atuais.
Antigos conceitos têm a vantagem de terem resistido ao teste do tempo após a implementação em centenas, milhares, milhões de situações diferentes. Além disso, essas inúmeras experiências permitem que, hoje em dia, possamos adaptar tais conceitos à realidade atual, contornando erros já cometidos e potencializando forças. Nesse artigo, vou tratar de um conceito criado ainda na década de 1920 e que se mostra essencial nos nossos tempos em que microempresas abertas em uma garagem podem disparar de tamanho em pouco tempo e exigir o crescimento exponencial do número de colaboradores.
Estou falando do chamado span of control (ou amplitude administrativa, na tradução do inglês). Formulado no Reino Unido em 1922 por Sir Ian Hamilton com vistas a racionalizar organogramas militares, esse conceito advoga haver um número ótimo de subordinados diretos a um gestor. Quando tal valor é excedido e uma quantidade excessiva de pessoas reporta diretamente ao gestor, a eficiência desse dirigente – e da empresa como um todo, consequentemente – tende a cair, trazendo perdas de produtividade e lucratividade.
Como dito, esse conceito, em parte esquecido atualmente, é essencial no contexto de startups. Conforme a empresa vai ganhando escala e robustez, há uma tendência do fundador em seguir concentrando decisões e responsabilidades, acumulando um número exagerado de diretos sob seu comando. No entanto, essa tendência fará com que o gestor tenha que dedicar uma parte considerável (ou mesmo todo) do seu tempo na relação com seus subordinados e observe uma perda expressiva na eficiência dessas relações.
Esse é o ponto-chave do span of control. O conceito, ajustado e adaptado por diversos teóricos e empresas ao longo dos anos, advoga que todo gestor possui uma quantidade finita de recursos –tempo, energia, atenção – a oferecer à companhia. Assim, quanto mais desses recursos forem gastos na interação com subordinados diretos, menor será a sua disponibilidade para empregar suas habilidades nas suas responsabilidades particulares. Isso é especialmente sentido nos níveis hierárquicos mais altos, que devem atuar no planejamento estratégico da companhia. Porém, o span of control deve ser observado por todo e qualquer gestor de empresa.
COMO CALCULAR O NÍVEL ÓTIMO
Ao tratarmos do span of control, uma pergunta se impõe: como calcular esse nível ótimo de subordinados diretos? Ou seja, como saber qual o número máximo recomendado de pessoas que devem responder diretamente a um gestor? Fazer esse cálculo é a chave para resolver os problemas de eficiência surgidos quando um mesmo profissional possui diversos subordinados trazendo suas dúvidas, opiniões e feedbacks diretamente a ela ou ele. Para realizarmos esse cálculo, é preciso, antes de tudo, deixar claro o que são subordinados diretos.
É evidente que CEOs – e outros ocupantes de cargos C-level – podem ter centenas ou mesmo milhares de colaboradores hierarquicamente abaixo deles nas estruturas organizacionais de grandes empresas sem que isso impacte na produtividade da companhia. No entanto, também é claro que a esmagadora maioria dessas pessoas não terá acesso direto a esse profissional. Assim, subordinados diretos são aqueles que reportam diretamente a um superior, levando suas impressões particulares e dos membros de sua equipe. É, portanto, esse universo de colaboradores que devemos levar em conta ao calcular o span of control adequado.
Se essa primeira resposta é mais simples, a definição do número de subordinados diretos é mais complexa e, na verdade, variável a depender de alguns fatores. Ao longo dos anos de desenvolvimento da teoria do span of control, diversas maneiras de calcular o nível ótimo de diretos foram criadas. Uma das opções mais modernas para esse cálculo foi formulada pela consultoria McKinsey. Em vez de determinar um número ideal, a empresa aponta para a existência de cinco arquétipos de gestores, cada um com seu limite de diretos próprio.
Esses arquétipos não estão ligados apenas à personalidade e características do gestor, mas também se relacionam ao tipo de trabalho produzido pelas equipes sob seu comando. Segundo tal modelo, esses tipos ideais são jogador, treinador, supervisor, facilitador e coordenador. Vamos resumir cada um deles brevemente.
O gestor do tipo jogador é aquele que “coloca a mão na massa”. Ele tem contato bastante aproximado com seus subordinados por seu perfil, mas principalmente pelas características do seu trabalho. O gestor jogador atua em funções que demandam longo tempo de aprendizado. Assim, é preciso desenvolver as habilidades dos diretos por tempo mais longo do que em outras áreas. Por isso, nesses casos, o nível ótimo varia de três a cinco diretos.
Logo depois, está o gestor treinador. Ele ainda participa bastante do dia a dia de seus subordinados, com interações frequentes, e desempenha funções variadas. Sua principal diferença para o arquétipo anterior é que os procedimentos operacionais estão melhor definidos e a curva de aprendizado é mais rápida. Esse gestor pode ter até sete subordinados diretos.
O terceiro arquétipo é o supervisor. Nesse caso, o gestor possui o que a McKinsey chama de um “nível moderado de responsabilidades individuais” e há equilíbrio entre suas funções próprias e a relação com os subordinados. Os diretos, que podem variar entre oito e dez, atuam todos em uma mesma área, com menor diferenciação entre a atuação de cada um deles.
Por fim, os dois últimos arquétipos – facilitador e coordenador – são bem parecidos. Ambos têm como objetivo primordial a atenção ao trabalho desempenhado por seus subordinados, sem maiores responsabilidades individuais. Por conta disso, são capazes (e até mesmo precisam) absorver um maior número de diretos. O principal diferenciador entre eles é que a atuação dos subordinados é extremamente padronizada – ou mesmo automatizada – no caso do coordenador. Estamos tratando aqui, por exemplo, do administrador de um call center.
Assim, conforme o estudo da McKinsey, gestores do tipo facilitador podem ter entre 11 e 15 subordinados diretos enquanto o gestor coordenador pode ter 15 ou mais diretos, a depender do tamanho da empresa na qual ele atua.
O QUE FAZER AO SUPERAR O NÍVEL ÓTIMO
Como vimos, a diferenciação proposta pela McKinsey, uma das muitas opções possíveis quando tratamos de span of control, está baseada fundamentalmente em três fatores: responsabilidades individuais do gestor, curva de aprendizado das funções e variabilidade do trabalho dos subordinados. Esse modelo é bastante útil na hora de determinar em qual dos arquétipos os gestores de uma empresa se enquadram e, portanto, quantos diretos cada um deles pode ter.
Contudo, uma última pergunta pode surgir: o que fazer quando o desenvolvimento da empresa faz com que esse nível ótimo seja superado? Está claro que, para evitar perdas de produtividade, será preciso reorganizar responsabilidades, abrindo mais cargos de gestor que comportem os subordinados diretos e times que passaram a exceder o nível ótimo daquele gestor. E como fazer isso? Alguns passos devem ser cumpridos para tornar esse tipo de alteração na estrutura organizacional o menos traumático possível.
Em primeiro lugar, é ideal que a companhia possua um organograma claro já definido. Nele, todos os colaboradores saberão que posição ocupam na hierarquia da empresa. Ao mesmo tempo, ter um organograma bem estruturado também permitirá que os gestores consigam determinar de maneira mais simples que tipo de rearranjo deverá ser feito para que se mantenha a efetividade das ações dos setores. Também é importante que esse acompanhamento do span of control seja constante de modo a evitar mudanças profundas na organização da companhia, mas pequenos ajustes sempre que for necessário.
Fazer valer os conceitos do span of control também passa por uma cultura organizacional em que esse tipo de arranjo na estrutura de trabalho seja bem aceito. Há muitos ambientes de trabalho em que ter um vasto número de subordinados diretos é a principal medida de prestígio e impacta muitas vezes na remuneração dos colaboradores. Nessas condições, os gestores tenderão a resistir a ajustes no organograma, mesmo que voltados a ganhos de produtividade, pois essa suposta perda de subordinados poderá representar para eles sinal de fraqueza ou perda de relevância na companhia.
Assim, o melhor é deixar claro o nível ótimo de subordinados diretos de cada posição de antemão para que as reorganizações sejam previstas. Mais: com isso, esses ajustes passarão a ser valorizados pelos colaboradores, uma vez que serão uma mostra de que seu setor está em expansão dentro da empresa, crescendo em nível mais acelerado que outros departamentos.
Como dito, tudo passa pela cultura organizacional e a atenção ao span of control deve fazer parte dela, uma vez que tem o poder de manter e elevar a eficiência dos colaboradores, gerar ambientes de trabalho mais saudáveis – já que facilita um maior conhecimento entre os membros das equipes – e motivar os times em prol do desenvolvimento da empresa.